A INSTIGANTE FILOSOFIA DE GIORDANO BRUNO.

 

 Juliana Vannucchi

 

 

Destrone-se a ideia de esta terra ser unida e propriamente centro do universo“. (Sobre o Infinito).

Giordano Bruno foi um filósofo, padre, místico, astrônomo cientista e poeta italiano, nascido em 1548 e que, em 1600, foi executado em Roma pela Inquisição que o acusou de heresia, blasfêmia e imoralidade. Mas não foi somente com a igreja católica que o pensador italiano teve problemas: Bruno também foi excomungado pela igreja calvinista e também luterana, pois suas ideias eram essencialmente muito diferentes dos preceitos que todas outras doutrinas religiosas ofereciam.

Nasceu em Nola, localidade próxima de Nápoles. Durante grande parte de sua vida, conviveu sobre influência do Catolicismo, sendo que durante a juventude, ingressou na Ordem dos Dominicanos, e posteriormente lecionou Teologia Calvinista em vários locais diferentes da Europa.

Bruno foi fortemente influenciado por Lúlio, Nicolau de Clusa e Nicolau Copérnico, e estudou intensamente a filosofia grega, medieval e a cabala judaica, além de ter tido contato com o Hermetismo e com a obra de Nicolau Agripa. Opôs-se ao pensamento Aristotélico, fato este, que fica claro em seus comentários sobre a física aristotélica, feitos no livro “Árvore dos Filósofos” (1585) e também em “Cento e Vinte Teses Antiperipatéticas Sobre a Natureza e o Mundo”. Escreveu mais de vinte livros e com o passar do tempo, sua intrigante e avançada filosofia foi bastante valorizada e seu pensamento influenciou grandes filósofos, tal como Spinoza e Leibniz.

A ARTE DA MEMÓRIA:

Conta-se que Giordano Bruno possuía uma memória impressionante e era capaz de decorar com facilidade, qualquer assunto, conversa ou leituras que fazia. Memorizava trechos, páginas e inclusive, livros completos. Esta habilidade peculiar foi chamada de “mnemotécnica” e não começou com o filósofo, sendo algo existente e conhecido  desde a Grécia Antiga. Contudo, não há nenhuma fonte específica que confirme as origens gregas, e esse fato carece de registros diretos e sabemos disso apenas porque é algo que foi transmitido por alguns filósofos ao longo da história.

Durante a Idade Média e o Renascimento, foram registrados alguns nomes de pessoas que possuíam esta mesma habilidade que Giordano Bruno. Dentre elas, encontram-se também São Tomás de Aquino e Alberto Magno. Tais indivíduos eram “capazes de decorar livros inteiros e depois debilita-los em exercícios de dificuldade cada vez maior, de trás pra diante, a cada três versículos, ou comparando trechos de livros diferentes”. (2008, p. 22).  Bruno possuía técnicas específicas para conseguir decorar tantas coisas, e chegou a ensinar a “arte da memória” para alguns de seus contemporâneos e no período em que viveu, esta singular capacidade foi um dos fatores que lhe garantiu popularidade em alguns locais da Europa.

Podemos dizer que as técnicas criadas e ensinadas por Giordano Bruno, eram feitas a partir de uma série de desenhos com símbolos que possuíam significados específicos. Outro artifício usado era a imaginação, que era utilizada como artifício para que se imprimisse na mente, aquilo que se desejava decorar.

Bruno chegou a ensinar a arte da memória para várias pessoas, dentre as quais conta-se que está incluído o rei Henrique III. Inclusive, uma de suas obras na qual o pensador italiano aborda a arte da memória, chamada “De umbris idearum”, foi justamente dedicada a Henrique.

O UNIVERSO:

As ideias do filósofo, além de serem notavelmente avançadas para a sua época, contrapunham-se aos ideais sustentados pela Igreja Católica e contrariavam as normas vigentes do período: “Desde cedo, Bruno mostrou suas tendências heterodoxas. Mesmo ainda quando noviço, ele abriu a atenção pela originalidade de seus pontos de vista e por suas exposições críticas das doutrinas teológicas então aceitas”. (WINTER, Othon. Jornal da UNESP, p. 6, n. 144, março, 2000).

Giordano Bruno acreditava que o universo era infinito e que havia seres inteligentes habitando outros planetas. Bruno dizia que se fosse Deus era infinito – tal como ele acreditava que fosse, sua criação também deveria ser igualmente infinita. Estes dois tópicos foram abordados em sua obra intitulada “Sobre o Infinito”.

Além destas menções, o pensador também propôs outras reflexões interessantes, como, por exemplo, a existência de planetas fora de nosso sistema solar: “Giordano Bruno aceitou a teoria heliocêntrica de Copérnico, segundo a qual o Sol é o centro do universo. Mas foi além.

Bruno pregava que as estrelas eram sóis distantes. E que ao redor desses ‘sóis’ giravam inúmeros mundos, e que esses mundos eram habitados por seres inteligentes”. (WINTER, Othon. Jornal da UNESP, p. 6, n. 144, março, 2000).

Seu pensamento era incrivelmente avançado para o período em que viveu, e o filósofo conseguiu determinar alguns fatos sobre o universo, que apenas séculos mais tarde seriam confirmados pela Ciência: “Ele afirmava, por exemplo, que, além de Saturno (o planeta mais distante do Sol conhecido até então), havia outros planetas que giravam ao redor do Sol. Isto foi confirmado com a descoberta dos planetas Urano, em 1781, por William Herschel, Netuno, em 1846, por Johann Herschel, e Plutão, em 1930, por Percival Lowell”. (Revista UNESP). Bruno, conforme mencionado anteriormente, foi influenciado pelas ideias de Copérnico.

PANPSIQUISMO, PANTEÍSMO e HERMETISMO:

O panpsiquismo também surgiu como um aspecto importante na filosofia de Giordano Bruno. Para ele, todos os objetos do planeta, desde substâncias minúsculas até as maiores que existem, possuem uma alma. A Terra estaria sempre num fluxo de movimento provindo da natureza anímica de tudo o que existe e tudo o que há no planeta, está sempre e continuamente se transformando: “O princípio anímico, para Bruno, não se distingue da própria matéria animada.

A metafísica que ele propõe constitui, assim, um rigoroso monismo materialista. Não existem para ele, duas substâncias (matéria e espírito) distintas. Tudo o que existe estaria reduzido a uma única essência material provinda de animação espiritual”. (1973, p. 232).

O filósofo também era Panteísta, pois para ele, Deus e o universo eram uma coisa só, sendo Deus, um ser infinito e que teria criado a Terra e o universo igualmente infinitos. Esse Deus estaria em tudo: “O TODO está em TUDO”. Além disso, um outro aspecto interessante de seu pensamento, é que Bruno não acredita que o homem pudesse atingir um conhecimento uno e fixo, pois para ele, a interpretação de um indivíduo sobre o mundo, sobre a realidade e sobre a natureza, sempre acontece de maneiras diferentes.

Em um de seus livros, intitulado “Tratado de Magia”, demonstra grande afinidade com o ocultismo, certamente, um fato que perturbou a Igreja Católica. Nesta obra, ele faz um estudo do verdadeiro significado de magia e do mago.

É possível perceber, não apenas neste livro, mas também em outros de seus escritos, que Bruno possuía influência do Hermetismo, prática a estudo que se baseia em registros associados à Hermes Trimegisto, que equivale à Thot, divindade egípcia da escrita, que representa também a sabedoria, a música e a magia.

”A Hermética desempenhou papel fundamental no pensamento de Bruno, com a ampla difusão que teve na Renascença. Quando inquéritos sobre as causas do movimento da Terra, na Ceia das Cinzas, Bruno responde com uma citação quase literal de textos herméticos”. (1973, p. 234).

Observações sobre este fato, podem ser encontradas num estudo chamado “Giordano Bruno e a Tradição Hermética”, cuja autoria é de Francis Yates. A autora explora a influência e retomada do hermetismo no pensamento renascentista e alguns pontos dos livros de Bruno que possuem esta influência.

JULGAMENTO, CONDENAÇÃO E MORTE:

Todas as ideias do filósofo foram inovadoras e apresentaram riscos ao poder e domínio da Igreja Católica.

O julgamento de Giordano Bruno durou sete anos, e durante este período, ele negou-se decididamente a renunciar suas ideias e arrepender-se das mesmas, mantendo-se firme diante daquilo que descobriu e que defendeu.

Muitas fontes contam que ao ouvir sua sentença, em 8 de fevereiro de 1600, teria, ousadamente dito aos juízes: “Vocês pronunciam esta sentença contra mim com um medo maior do que eu sinto ao recebê-la”. Foi queimado em praça pública e enquanto ardia em chamadas, virava o rosto contra um crucifixo, tendo com esta atitude, mostrado até os últimos momentos, sua recusa aos dogmas da Igreja Católica.  Abaixo, seguem as acusações contra o pensador, escritas por  Luigi Firpo:

  • sustentar opiniões contrárias à fé católica e contestar seus ministros;
  • sustentar opiniões contrárias à fé católica sobre a Trindade, a divindade de Cristo e a encarnação;
  • sustentar opiniões contrárias à fé católica sobre Jesus como Cristo;
  • sustentar opiniões contrárias à fé católica sobre a virgindade de Maria, mãe de Jesus;
  • sustentar opiniões contrárias à fé católica tanto sobre a Transubstanciação quanto a Missa;
  • reivindicar a existência de uma pluralidade de mundos e suas eternidades;
  • acreditar em metempsicose e na transmigração da alma humana em diferentes corpos;
  • envolvimento com magia e adivinhação.

 

 

 

 

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

BRUNO, Giordano. Sobre a Natureza, 2008. Editora: Martins Fontes.

BRUNO, Giordano. Editora: Abril, Coleção “Os Pensadores, 1973.

DARIO, Antiseri. REALE. Giovani. História da Filosofia, 2005. Editora: Paulus.

Jornal UNESP. Nº: 144, 2000.

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