Gilberto Simões Pires,
em Ponto Crítico. 30.12.2019
30/ 12/ 2019
APOSTANDO NA DÉCADA
O ano de 2019, depois de muitos anos de comprovada AMARGURA ECONÔMICA, pelo grau de confiança e esperança que habita os ambientes daqueles com os quais mais me relaciono, está chegando ao fim em clima de elevado ALTO ASTRAL. Este sentimento dá a dimensão correta do quanto boa parte do povo brasileiro está apostando, não apenas em 2020, mas na década 2020/2030 que começa dentro de dois dias.
REFLEXÕES E PROJEÇÕES
Aproveitando o momento, que se presta, tanto para as devidas reflexões daquilo que foi possível colher ao longo do ano que se encerra quanto para fazer projeções responsáveis e/ou cabíveis no espectro da ilimitada e eterna ESPERANÇA, eis aí a análise feita pelo pensador e economista Paulo Rabello de Castro – 2020: O QUE NÃO ESTÁ GARANTIDO – :
ESPERANÇAS RENOVADAS
Há esperanças renovadas em torno de 2020. Recente levantamento do LIDE – Grupo de Líderes Empresariais – indica que as expectativas do setor privado voltaram a encostar no nível de 2010, último ano realmente muito bom nos últimos dez anos.
As vendas e o emprego têm condição de surpreender acima do que hoje preveem os principais analistas. A razão é bem simples: não há nada de errado com a ECONOMIA PRODUTIVA. A inflação é baixa, o câmbio é muito competitivo e, pela primeira vez, o Banco Central se permitiu ajustar os juros para seu nível normal. O ano de 2020 espelhará todos esses aspectos favoráveis – alguns inéditos – conjugados para permitir um salto no crédito.
PRÓXIMO DE ZERO
A economia brasileira poderia crescer mais de 5% em 2020. Em parte, seria mera reação estatística aos níveis deprimidos de produção e emprego, na década que agora se encerra. Se o PIB de 2020 crescer na faixa esperada de 2,5%, ainda assim o crescimento médio do período de 2014 até 2020 será um número próximo a zero.
O País perdeu mais uma década e nenhuma investigação a fundo questionou isso. Portanto, se a economia surpreender com até 5%, será mais por reação de um corpo saudável brigando contra uma doença do que por mérito especial da terapia. Esta continua onde sempre esteve.
INVESTIMENTO BAIXO
O governo governa os outros mas se governa bastante mal. O rigor que aplica ao setor privado com impostos e burocracia não encontra paralelo na complacência que aplica a seu próprio déficit fiscal primário, fonte da incapacidade do governo de investir e de repactuar as dívidas da Federação. O baixíssimo investimento federal e a inapetência do governo de chamar os Estados para um acerto definitivo do seu endividamento são os fatores impeditivos de uma retomada produtiva em grande escala do Brasil.
DÉFICIT PÚBLICO
O apelo às privatizações tampouco funcionou este ano para tapar o buraco das contas públicas. A venda da riqueza do pré-sal apenas amenizou o rombo federal em 2019. Mas não houve ataque frontal a nenhum problema público de maior gravidade, nem mesmo o da Previdência, cujo déficit continuará agravado em 2020, apesar de toda promessa de uma economia multibilionária em anos futuros.
A RAIZ
Na raiz de tudo está uma coisa só: o governo continua sendo o extrator de recursos dos segmentos produtivos, seja empresas ou famílias, que pagam o preço amargo de sustentar a máquina mortífera em que se transformou o Estado brasileiro. O remédio, portanto, não é privatizar esta ou aquela estatal, mas questionar toda e qualquer despesa mal feita ou fora do lugar. O Estado não tem mecanismos para isso. O governo, embora de orientação liberal, ainda não soube lidar com essa questão de como combater a máquina pública que trabalha para si mesma e não para benefício da expansão dos empregos e oportunidades produtivas.
O impasse dentro do governo esteve estampado na sua dificuldade de definir e empurrar para frente a reforma das reformas, ou seja, a reforma dos impostos. Isso não é por acaso. Dentro do ventre do governo há uma resistência poderosa contra qualquer suposta ameaça às receitas públicas que sustentam a máquina. O governo invisível não ajuda o ministro Guedes a definir qual reforma tributária se quer aprovar, afinal. Nisso, o Congresso e os governos estaduais parecem mais dispostos a enfrentar os riscos naturais de uma mudança fiscal para valer. O governo invisível em Brasília não topa arriscar nada. Por isso se fala de novo numa reforma tributária fatiada em quatro etapas, a perder de vista. É o mesmo papo da era Dilma e Temer repetido – por incrível que pareça – pelo grupo político que se diz a encarnação de seu oposto total. Mas não há surpresa nisso. É a máquina funcionando por trás do governo Bolsonaro da mesma forma que decidia por Dilma ou Temer, e seus ministros. É o mesmo Brasil, ano após ano, a nos recordar que somos um país dominado pelos grupos que dominam o Estado para garantir seus próprios soldos e vantagens. Idem, em maior ou menor grau, nos Estados da Federação. Este é o problema nacional intocado. O resto é consequência.
Embora improvável, esperamos ser surpreendidos por um 2020 em que, por primeira vez, não sejamos governados pelas consequências. Essa surpresa é a única parte do cenário 2020 que pode, de fato, representar novidade. É a única parte, aliás, que não está garantida.