Fernando Fabbrini.
18.06.2020
Claro que não me refiro ao Covid-19. As redes sociais e os alarmistas já se encarregam de espalhar o terror e, lá de vez em quando, muito raramente, prestam uma mísera informação útil ao cidadão. Graças ao vírus chinês, fruto da canalhice de uma ditadura centenária, vivemos essa pandemia que exige mudanças de hábitos e seguimos em frente. O que está ao nosso alcance, fazemos: máscaras, isolamento, álcool-gel. Porém,devemos estar conscientes de que sobre o imponderável – infelizmente e filosoficamente – não temos controle algum.
Falo é do temido vírus Corrupt que assola a humanidade há séculos. O agressor atua caladinho nos quatro cantos do mundo, não poupa ninguém. Como os demais, aproveita-se das fragilidades do organismo social para invadi-lo. Nações com um sistema jurídico decente e onde o povo sabe que a cidadania é o melhor anticorpo são menos vulneráveis. Quando o vírus dá as caras, reagem de imediato e salvam-se todos.
Já no Brasil tal vírus é endêmico na forma Corrupt-30%; faz parte de nossa cultura desde os tempos de Cabral. Aqui,para piorar, o danado vem exibindo mutações constantes, variando nas formas Corrupt-40%, Corrupt-50%, Corrupt-70% e até maiores, de potencial altamente danoso.
Nos anos recentes tivemos uma onda do Corrupt que arrasou o país. A voracidade com a qual ele agiu foi surpreendente. Instalado nos organismos públicos e privados contaminou empresários, políticos, tribunais, juízes, advogados, imprensa, opinião pública. O vírus ataca a mente do enfermo levando-o a pensar exclusivamente em si; uma combinação aguda e enlouquecida de prepotência, ganância, vaidade e descaso com seus semelhantes.
De aparência enganosa, dizendo-se aliado dos mais frágeis e humildes, o Corrupt penetrou onde quis e se alimentou à vontade de seus principais nutrientes: reais, dólares, euros, bitcoins. Mas também aceitava favores, empregos, sinecuras e cargos de boa-vida. Minando as reservas do povo, engordava e enriquecia os cúmplices.
Detectado com frequência por pesquisadores intrigados, o Corrupt brasileiro logo usava seus disfarces e passava-se por um bichinho bonzinho. Aplicava-se um reagente qualquer – como perguntas comuns sobre sua origem e sobrevivência – e ele esperneava, inventava acusações, disparava adjetivos contra quem o ameaçasse. Quando pego em flagrante inquestionável, sem saída, o Corrupt assumia sua forma mais violenta: simplesmente liquidava o responsável pela denúncia.
Iludido pelas artimanhas do Corrupt, o cidadão brasileiro só percebeu o tamanho do estrago quando o mal já estava feito. Em consequência dos altos piques do Corrupt o contribuinte procurava um hospital e encontrava – por exemplo – um estádio de futebol; um porto num país estrangeiro; uma obra de saneamento interrompida. Levava o filho à escola e pelas frestas do portão enxergava vestígios de refinarias sucateadas, escritórios luxuosos de empreiteiras e frigoríficos; malas cheias de dinheiro. Queria viajar numa estrada boa e segura, mas sua rota o conduzia a misteriosos sítios, apartamentos à beira-mar, países estrangeiros comandados por ditadores amiguinhos.
A vacina contra o Corrupt existe há tempos; faz parte do sistema imunológico humano desde nossos antepassados mais distantes. Agora, como prevenção em caso de desabastecimento por surtos, vale uma passada no seu banheiro. Lá provavelmente há um armário e um espelho. No armário, pegue a embalagem com o rótulo “Vergonha na Cara”. Olhando-se no espelho, engula uma dose e pense nos seus filhos, na sua família, na nação pobre e carente onde você habita. Costuma funcionar.
Entretanto, como no caso da cloroquina, azitromicina, corticoides e outros medicamentos em pesquisa por causa da Covid-19, a imunização definitiva contra o Corrupt depende do estado geral do paciente. Por isso, hábitos nocivos, caráteres fisiológicos e morbidades pré-adquiridas são determinantes. Nem sempre há cura, infelizmente.
*Publicado originalmente em 18/06/2020
em O Tempo de BH e enviado pelo autor.