COMO A ESQUERDA VENCE SEM PRECISAR ARGUMENTAR

Eduardo Levy.
08.08.2017

Imagine um departamento de Matemática qualquer, seja o da faculdade da esquina, seja o de Harvard. Quantos adeptos verdadeiros da ideologia de gênero haverá nele? Se o conhecido apreço dos matemáticos por dados objetivos ainda for o mesmo, é difícil que sejam muitos.

Mas não faz diferença, pois se quase ninguém ali a defende, absolutamente ninguém a combate, já que fazê-lo resulta na destruição da própria carreira. Quem pode intimidar não precisa persuadir: é assim que se pode retratar como fruto de consenso universal ideias que são alvo de dissenso universal.

Ao longo da história das ideias da nossa cultura, até as correntes mais autoritárias procuraram conquistar adeptos por meio da persuasão racional. Mesmo nas conversões forçadas e nas guerras de religião, a espada vinha acompanhada do silogismo. O que a esquerda descobriu, e ao que deve sua hegemonia cultural de décadas, é que a persuasão racional não é apenas desnecessária, é prejudicial. Pois quando argumentamos, o adversário tem o mau hábito de contra-argumentar, existindo sempre o risco de que seus argumentos sejam melhores. Muito mais eficiente é passar a agir como se já tivéssemos vencido o debate, tendo provado não somente o acerto de nossas ideias quanto a maldade das ideias opostas, e passar a perseguir os dissonantes. Para obter hegemonia não é necessário que todos concordem; basta que ninguém tenha coragem de discordar. Que me importa que, no fundo de sua consciência, José ache a ideologia de gênero uma monstruosidade? Importa apenas que ele jamais dirá isso em público, pois fazê-lo o transformaria em desempregado perpétuo. Que pessoas como José se calem é suficiente para criar a impressão de consenso; está é suficiente tanto para impor normas legais e práticas culturais quanto para justificar a perseguição aos discordantes, a qual, por sua vez, reforça a impressão de consenso. É o ciclo perfeito, nada mais é necessário.

Parece exagero? Pois considere: Quantos argumentos você já leu a favor dos pressupostos, das conclusões e das exigências práticas da ideologia de gênero? Que debates a respeito dela aconteceram antes que se tornasse uma obrigação tácita de todos aceitá-la sob pena de ostracismo? Que disputa de ideias ocorreu antes que se começasse a ensinar às crianças que o sexo com que nasceram não tem a menor importância e a submetê-las a cirurgias mutiladoras irreversíveis? Quando foi que essa discussão foi vencida pelos ideólogos de gênero? Faça a si mesmo perguntas semelhantes trocando “ideologia de gênero” por outras ideias da esquerda que se tornaram dogmas incontestáveis e verá que a resposta é sempre jamais. Jamais debate nenhum foi vencido porque jamais debate nenhum aconteceu. A esquerda não argumenta. Faça com que opor-se a suas ideias resulte em ostracismo, ridículo e boicote e nunca mais precisará defendê-las.

É assim porque ter razão é muito diferente de ter poder. A criança não obedece aos pais porque acha que tenham razão, a vítima não obedece ao bandido porque foi persuadida de seu clamor (a não ser que seja a Maria do Rosário), nem este obedece ao policial por estar convencido da beleza da ordem legal. Ter razão—ou, mais propriamente, parecer ter razão—é apenas um dos meios de conquistar e exercer poder, e o mais frágil deles. Pois mesmo o melhor dos argumentos pode ser contestado, ao passo que um emprego perdido, uma cela de prisão e uma bala na testa são irrefutáveis. Não foi por outro motivo que a esquerda se tornou imbatível no momento em que desistiu de ter razão.
E como reagem seus adversários? Respondem a cada intimidação com um silogismo, a cada boicote com um dado, a cada reputação assassinada com um gráfico. Nas publicações de esquerda encontram-se diretrizes comportamentais e repreensão aos dissidentes, nas de direita argumentos e estatísticas. Os liberais (no sentido brasileiro da palavra), especialmente, fazem um esforço comovente para nunca pôr em forma escrita conclusão desacompanhada de uma estatística irrefutável que a embase. Será que jamais lhes ocorreu questionar-se por que ter razão com tanta frequência nunca lhes trouxe vitória política nenhuma? A superioridade absoluta do liberalismo econômico, tanto nos seus fundamentos teóricos quanto nos seus resultados práticos, é um dos fatos mais comprovados da história das ideias, fato que só pode negar quem não quer vê-lo. O adversário contra o qual se bate, por outro lado, o marxismo, já nasceu refutado em seus fundamentos teóricos e refutou-se a si mesmo em seus resultados práticos, que foram invariavelmente miséria, tirania e massacre. Por que, apesar disso, há tantos marxistas e tão pouco liberais? Será que em vez de suar tanto para mostrar a realidade a quem não quer vê-la os liberais não fariam melhor se tentassem descobrir por que não lhes serviu para nada estar certos?

Do princípio ao fim, a história do século XX é uma longa refutação das ideias da esquerda. Do momento ao princípio, a história do XXI é uma demonstração da hegemonia absoluta da esquerda. Enquanto seus adversários continuarem a combater ações com argumentos, ela continuará a vencer todas as batalhas práticas; que o faça apesar de perder todas as teóricas é apenas mais uma demonstração de seu poder. Quem quiser vencê-la deve deixar de analisar gráficos e passar a analisar estratégias de ação, deixar de denunciar os erros e passar a denunciar os errados, abandonar a luta contra as teorias e adotar a luta contra as práticas, desistir de combater ideias e passar a combater pessoas.
#paz

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