O COAF não tem de ficar nem com a Justiça nem com a Economia

– tem de ser extinto

A estrovenga é uma soviética peça de um estado policialesco

Roberto Rachewsky

COAF significa Conselho de Controle de Atividades Financeiras. Trata-se de um órgão da burocracia federal criado em março de 1998, durante o primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso.

A função auto declarada do COAF é “disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar ocorrências suspeitas de atividade ilícitas relacionada à lavagem de dinheiro”.

Eis o que se encontra em sua página:

O Conselho de Controle de Atividades Financeiras – Coaf tem como missão produzir inteligência financeira e promover a proteção dos setores econômicos contra a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo.

O Coaf recebe, examina e identifica ocorrências suspeitas de atividade ilícita e comunica às autoridades competentes para instauração de procedimentos. Além disso, coordena a troca de informações para viabilizar ações rápidas e eficientes no combate à ocultação ou dissimulação de bens, direitos e valores.

O Conselho aplica penas administrativas nos setores econômicos para os quais não exista órgão regulador ou fiscalizador próprio.

Deixando a linguagem rebuscada de lado, e falando mais coloquialmente, a função do COAF é espionar (e denunciar) toda e qualquer movimentação financeira feita por indivíduos privados.

Consequentemente, qualquer movimentação financeira a partir de R$ 10 mil reais já obriga os bancos a delatarem os correntistas para o COAF. Ainda pior: uma operação que envolva o saque de R$ 50 mil(preço de um carro) já é imediatamente tida como “indevida” e imediatamente recebe a suspeita de ser ou “lavagem de dinheiro” ou “financiamento de atividades criminosas”. O indivíduo que cometer tal ato terá sua privacidade financeira vasculhada e devassada.

O órgão nasceu vinculado ao Ministério da Fazenda. No entanto, recentemente, o Executivo determinou, por meio de medida provisória editada em janeiro, que o conselho passaria a ficar subordinado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, pasta comandada por Sérgio Moro.

Como era de se esperar, a transferência do controle de um órgão tão poderoso e invasivo de um ministério para outro gerou enormes atritos, conflitos e ciúmes em Brasília. Não era para menos.

Resquícios soviéticos

Sejamos diretos: o COAF é um dos inúmeros subprodutos da mentalidade coletivista estatista que nos assola. Ele existe porque o governo acredita que a liberdade e a privacidade do cidadão têm de estar subordinadas à vigilância e à segurança — vigilância e segurança do governo, é claro.

Na prática, com o COAF (em conjunto com a Receita Federal), o governo quer saber, a todo o instante, o que estamos fazendo com o que é nosso. Dado que o governo usufrui enormes poderes para intervir em nossas relações, ele recorre ao COAF para “seguir o dinheiro” e, assim, além de xeretar o comportamento financeiro de qualquer indivíduo, vasculhar quem não está agindo dentro dos conformes estabelecidos por ele mesmo — os quais são alterados com grande frequência.

Sob o pretexto de combater o terrorismo, a corrupção dos agentes do próprio governo e o enriquecimento ilícito de terceiros (na prática, qualquer enriquecimento pode ser enquadrado como “ilícito”), o governo, na prática, quer também, e principalmente, espionar a vida privada das pessoas, combater o tráfico de drogas, a sonegação fiscal e mesmo o enriquecimento privado, do qual o governo sempre ambiciona um naco.

Só que apenas terrorismo e corrupção são as atividades violentas nesse rol, pois são as únicas que agridem terceiros inocentes. As demais representam apenas indivíduos ou grupos de indivíduos interagindo para produzir, comercializar ou consumir o que contratam livremente (sim, inclusive drogas).

A existência do COAF e de leis que obrigam os bancos e outras instituições a informarem o que deveriam manter sob sigilo mostram, por si só, que vivemos sob um estado de sítio, no qual os direitos individuais — entre os quais o direito à liberdade e à propriedade — são violados sistematicamente.

No entanto, é espantoso constatar que a sociedade não apenas não critica a existência dessa aberração cívica, como a aplaude. Pior: participa engajadamente do debate, acaloradamente discutindo a destinação do órgão, e nunca a excrescência que é a existência deste aparato soviético.

A questão é básica

Problemas como corrupção ou enriquecimento ilícito não são resolvidos atuando sobre as consequências, que é o que o COAF, na melhor das hipóteses, faz. Tais problemas devem ser tratados na raiz, em sua causa original: dentre elas, a necessidade da redução drástica do tamanho e dos poderes do estado.

Corrupção é consequência direta de se ter um estado agigantado e onipresente, que em tudo intervém e de todos cuida. A concentração de poder no estado faz com que ele se torne um irresistível instrumento de redistribuição de renda: dos pagadores de impostos para as minorias organizadas (lobbies, grupos de interesse e grandes empresários com conexões políticas). Enquanto houver estado grande, intervencionista e ultra-regulador, corrupção, lobbies, grupos de interesse e subornos sempre serão a regra.

Por outro lado, se o estado perde seu poder de conceder privilégios àqueles grupos que o capturam, estes não irão adquirir autoridade política para obter privilégios à custa da sociedade. Nenhum empresário ou sindicato pode comprar favores de um funcionário público que não tenha favores para vender.

De resto, o COAF é mais um enxugador de gelo que apenas ajuda a produzir água congelada. O dia em que uma investigação criminal batesse à porta de um banco, caberiam aos investigadores obter autorização judicial para vasculharem o que estivesse relacionado com o crime investigado. Isso é estado de direito. Qualquer coisa fora disso é estado policialesco.

Discussão profunda não é se o COAF vai ficar com o Ministério da Economia ou com o Ministério da Justiça. O que deve ser discutido é se o COAF deveria existir, se tem valor, para quem e para o quê.

 

Artigo originalmente publicado no site do Instituto Liberal

Roberto Rachewsky
é empresário da área de comércio exterior. Fundador do Instituto de Estudos Empresariais (IEE) e do Instituto Liberal do Rio Grande do Sul, do qual foi vice-presidente na década de 1980. Participou da diretoria da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Porto Alegre, da Associação dos Dirigentes de Marketing e Vendas do Brasil do Rio Grande do Sul (ADVB-RS) e da Federação das Associações Comerciais e de Serviços do Rio Grande do Sul (Federasul). Atualmente, é conselheiro do IEE.

 

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