As Potências e Lojas Maçônicas

Ambrósio Peters

Os maçons se congregam em lojas, que se organizam em potências. As lojas, que são a base fundamental, se constituem com um determinado número mínimo de membros, obrigatoriamente iniciados em uma loja regular de acordo com os Landemarques. Essa tradição na formação de novas lojas mantém uma transmissão regular que vem dos tempos dos maçons medievais e foi assumida pela Maçonaria Moderna. Esta é a legítima e única regularidade maçônica.

Uma nova loja pode surgir sempre que o número de membros de alguma loja regular ultrapassar um certo nível, definido de acordo com a região geográfica e os interesses de ampliação da Maçonaria. Em alguns casos, bastante raros, uma nova loja pode ser fundada por motivo de dissidências internas. Qualquer ato de fundação, contudo, dependerá sempre da autorização administrativa do grão-mestrado a que pretende se ligar.

Quando não há essa autorização a nova loja é considerada espúria e normalmente tem existência atribulada e curta. Essas lojas espúrias geralmente são fundadas com terceiras intenções e, por vezes, provocam escândalos prejudiciais ao bom nome da Ordem. Foi o caso da famosa Loja P2, na Itália.

As lojas são absolutamente autônomas quanto ao direcionamento de seus trabalhos, às suas atividades maçônicas internas e às atividades sociais externas. Fazem seus próprios estatutos que, depois de submetidos à aprovação formal do grão-mestrado, passam pelo registro público oficial para lhes dar personalidade jurídica legal. Têm também seus próprios regimentos internos, que regulam o seu funcionamento administrativo. Ambos documentos devem estar conforme os Landemarques e a constituição do respectivo grão-mestrado.

O grão-mestre somente pode interferir administrativamente nas lojas quando nelas se verificarem práticas antimaçônicas ou quando houver desrespeito formal ao regulamento geral do grão-mestrado, ou quando se ferirem os Landemarques.

Administrativamente as lojas se compõem em potências administrativas formadas por um determinado número mínimo de lojas. Estas potências são conhecidas como grandes orientes ou grandes lojas. Cada potência tem sua própria constituição cujo resumo, devidamente registrado, lhe dá também personalidade jurídica legal. Para seu funcionamento interno têm um regulamento geral, que regula também administrativamente o funcionamento das lojas.

As potências maçônicas têm sempre uma jurisdição territorial bem definida. Há grandes orientes nacionais que supervisionam os grandes orientes estaduais, ou regionais, chamados de grandes orientes confederados. E o exemplo do Grande Oriente do Brasil, um órgão superior administrativo que supervisiona todos os grandes orientes estaduais confederados do Brasil.

Há os grandes orientes independentes, que não adotam o sistema federativo dos grandes orientes nacionais. Suas jurisdições podem abranger uma unidade administrativa de um país, como um estado no Brasil, ou apenas uma parte dela. As grandes lojas seguem o mesmo sistema dos grandes orientes independentes.

Os grandes orientes e as grandes lojas são administradas por um grão-mestre que é, administrativamente, a autoridade máxima dentro da sua jurisdição maçônica, exceção feita ao sistema de confederação dos grandes orientes nacionais, cuja maior autoridade é o grão-mestre geral.

Os grão-mestres são as instâncias últimas dentro da Maçonaria e não há nenhuma autoridade maçônica acima deles. Nem mesmo as confederações maçônicas, como a COMAB, no Brasil, podem interferir em seu âmbito administrativo. Acima deles estão apenas os Landemarques.

Os grão-mestres devem seguir rigorosamente as constituições de seu grão-mestrado que, sempre aprovadas por colegiados, não podem ferir as tradições maçônicas e nem os Landemarques.

As lojas, por sua vez, são administradas por um venerável mestre, que é a autoridade máxima em sua loja em assuntos administrativos comuns previstos nos estatutos e no regimento interno. Decisões que extrapolem esse âmbito devem ser submetidas a aprovação da assembleia da loja, ou ao grão-mestrado. Nem o grão-mestre, nem o venerável mestre, nem qualquer outro maçom componente de seus respectivos grupos administrativos e nem mesmo qualquer irmão individualmente podem se manifestar oficialmente em nome da Maçonaria, a não ser que, em cada caso, estejam especialmente autorizados por uma assembleia da loja ou do grão-mestrado. Essas autorizações, sempre especiais, somente podem ser dadas em caráter excepcional e somente sobre assuntos gerais precisamente predeterminados, ou para situações e ocasiões especiais.

Dessa forma, quando alguma autoridade maçônica se pronuncia em público sem autorização, sobre assuntos que não digam respeito aos poderes do seu cargo, ela o faz apenas em seu próprio nome e não em nome da Maçonaria ou dos maçons.

Essas disposições de organização e essa forma de exercício de autoridade fazem parte dos Landemarques e impedem que se possa travar diálogos de qualquer espécie entre a Maçonaria, como ordem, e outras instituições profanas. Esse é um dispositivo que mantém intacta a tradição maçônica moderna já por mais de três séculos.

Recentemente foi noticiado um diálogo entre os bispos alemães e os grão-mestres da Maçonaria alemã. Essa notícia de início já encerra um equívoco. Não há uma Maçonaria alemã, pois não há maçonarias nacionais. Há apenas a Maçonaria na Alemanha. A Maçonaria não tem nacionalidade. Em segundo lugar, esses grão-mestres somente poderiam ter falado em nome de seus respectivos grão-mestrados, se autorizados, ou então por si próprios, se não autorizados, e jamais em nome da Maçonaria. Tudo o que disseram terá sido apenas sua opinião pessoal e não opinião oficial da Maçonaria.

Após esse aparente diálogo teriam os bispos da Alemanha concluído que a Maçonaria prega uma definição de Deus difusa e indefinida, que comprovaria a sua incompatibilidade com a religião. A conclusão é completamente equivocada.

Esse sistema administrativo evita que eventuais elementos mal intencionados se infiltrem nas lojas maçônicas e tentem modificar a Maçonaria. Na eventualidade de algum elemento desses conseguir agir dentro de uma loja e chegar ao seu intento, sua ação ficará restrita ao âmbito dessa loja. Por exemplo, uma tentativa de cristianizar a Maçonaria somente teria êxito se essa cristianização fosse feita de loja em loja e repetida sempre que houvesse mudanças no corpo administrativo.

Isso também torna incongruente querer acusar de anticlericalismo a Maçonaria em geral porque alguma loja em particular entrou em litígio com autoridades eclesiásticas. É, portanto incorreto querer condenar ou excomungar todos os maçons da face da Terra porque alguma loja se pronunciou anticatólica.

A primeira potência maçônica a se fundar, no ano de 1717, foi a Grande Loja de Londres (não da Inglaterra), com jurisdição sobre Londres, Westminster e arredores. Esta grande loja contribuiu para a formação da Grande Loja Unida da Inglaterra no ano de 1813. E importante observar que em 1717 nasceu a organização da Maçonaria Moderna em potências administrativas. Se havia lojas para formar uma potência é forçoso concluir que já existiam lojas maçônicas modernas anteriormente àquele ano. Portanto 1717 não é o ano do surgimento da Maçonaria Moderna*.

Quando a Maçonaria começou a se desenvolver de forma mais organizada, no início do século XVIII, os contingentes militares ingleses que se deslocavam para as colônias do Reino Unido (Américas, Índia, Nova Zelândia e Austrália) levaram consigo os ideais maçônicos. Nessas colônias fundaram também grandes lojas com a autorização e a supervisão da Grande Loja de Londres, que decidia sobre a sua regularidade ou não.

Essa circunstância levou a posterior Grande Loja Unida da Inglaterra a se auto-julgar o arbitro da regularidade de todas as potências maçônicas, mesmo daquelas fundadas fora do Reino Unido, quando na verdade a sua jurisdição nunca foi além dos limites da Inglaterra. Suas decisões quanto ao reconhecimento ou não da regularidade de potências só têm tido efeitos práticos dentro dos limites de sua própria jurisdição.

A Grande Loja de Londres tem o privilégio de ter sido a primeira potência maçônica a ser criada formalmente, mas essa primazia não lhe confere autoridade sobre nenhuma outra potência. Ela é a potência Primaz, não a Potência-Mãe das potências. Esta primazia não a institui como um poder maçônico superior, como por vezes os não maçons poderiam pensar. E conclusão lógica que a constituição de 1723 é a constituição da Grande Loja de Londres, e não a constituição da Maçonaria Universal.

 

* Remetemos o leitor ao capítulo “Os Maçons Especulativos”.

 

 

Ir AMBRÓSIO PETERS.
A R L S “Os Templários”
GOB/Paraná
Or de Curitiba – PR.
Escritor, Historiador Filosofo e Livre Pensador.
CURITIBA, quarta-feira, 5 de julho de 1995

 

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