Jonas da Silva Azevedo * *
INTRODUÇÃO
Paulo Reglus Neves Freire, mais conhecido como Paulo Freire, foi um educador brasileiro, pensador e criador da tendência progressista libertadora.
Paulo Freire é conhecido por “criar” um método de alfabetização que alfabetizou 300 cortadores de cana-de-açúcar em apenas 45 dias na cidade de Angicos, no Rio Grande do Norte. Baseado na experiência de Angicos, em janeiro de 1963, João Goulart, presidente do Brasil na época, chamou Paulo Freire para organizar o Plano Nacional de Alfabetização. Falecido em 1992, Paulo Freire tornou-se Patrono da Educação Brasileira por força da Lei nº 12.612, de 13 de abril de 2012.
Sua principal obra é o livro Pedagogia do Oprimido o qual é referência em leituras no meio acadêmico nas áreas de licenciatura e pedagogia de diversas universidades do Brasil e do mundo. Mas atualmente o pensamento educacional de Paulo Freire, em especial no Brasil, tem sido questionado e acusado de ser um propagador das ideias marxistas. Outra acusação que a vertente pedagógica recebe é que os baixos índices de desempenho educacional nos alunos são devidos à aplicação das suas ideias e seu método. Mas, afinal, quais os fundamentos que os anti freireanos têm para afirmar que o pensamento de Paulo Freire leva à doutrinação e ao fracasso da educação brasileira?
POR QUE A PEDAGOGIA FREIREANA LEVA À DOUTRINAÇÃO POLÍTICA, IDEOLÓGICA E PARTIDÁRIA?
Paulo Freire publicou diversas obras, mas a análise do seu pensamento pedagógico será feita aqui a partir de dois dos seus livros: A Pedagogia do Oprimido e Pedagogia da Autonomia, que são as principais bases para sua concepção de ensino. Pode-se dizer, pelo menos em hipótese, que a obra Pedagogia da Autonomia é uma continuação da Pedagogia do Oprimido; aquela mostra como deve ocorrer a educação entre professor e aluno e esta denuncia a educação tradicional e propõe uma pedagogia libertadora. Importa indagar, desde já, se e em que medida Paulo Freire propõe uma educação realmente libertadora ou antes um método de manipulação ideológica e partidária.
Paulo Freire, no início da obra Pedagogia do Oprimido, mostra duas classes de pessoas: os opressores e os oprimidos. Os opressores são os burgueses, os donos da economia, aqueles que estão no topo do poder; os oprimidos são aqueles que estão na base da pirâmide social, sendo controlados pelos opressores. Segundo Freire, baseando-se em Karl Marx, os oprimidos são alienados e manipulados para servir e sustentar, com o seu trabalho e a sua subserviência, a grandeza e o poder dos opressores, proprietários dos meios de produção. Freire afirma que a educação é um desses meios que os opressores usam para manipular os oprimidos, deixando-os assim alheios à sua realidade política e social e incapacitados para criticá-la.
A princípio, essa pedagogia parece ser correta, pois, afinal, a criticidade é realmente importante num processo de aprendizagem. Porém, o que a pedagogia de Paulo Freire propõe, pelo menos em relação ao ensino e aprendizado entre o professor e o aluno, é fazer do professor um propagador e doutrinador do ideário neomarxista e fazer dos alunos militantes dessas mesmas causas.
Três fatores ajudam a esclarecer por que esse pensamento pedagógico tende e leva à manipulação e doutrinação política e ideológica. Mas desde já é importante ressaltar que essa pedagogia tende não apenas a um viés marxista, mas também a outros vieses ideológicos e partidários. A fórmula e o método são os mesmos, o conteúdo ideológico é que pode ser diferente. Consideremos esses:
- Para Paulo Freire, educação bancária é opressão. Mas o que seria essa educação bancária?
Como observa Marcelo Centenaro,
Paulo Freire descreve dois tipos de educação, uma característica de uma sociedade opressora, outra característica de uma sociedade livre, ou que luta para se libertar. A educação da sociedade opressora é chamada de “bancária”, sempre entre aspas, porque ela deposita conhecimentos nos alunos. Ou seja, ela reduz o aluno a um objeto passivo do processo educacional, no qual são jogadas informações sobre Português, Matemática, História, Geografia, Inglês, Física, Química, Biologia, Filosofia. (CENTENARO, 2015)
Educação bancária, portanto, é todo conhecimento (saber) já pré-estabelecido e sistematizado, incluído conhecimentos que a humanidade desenvolveu ao longo dos anos graças ao método científico, o qual é feito com racionalidade e lógica. Para Freire, o professor que ensina os seus alunos conteúdos programados e disciplinares está utilizando de um método opressor, pois dessa forma, o educador está apenas inculcando na mente dos seus alunos conhecimentos tradicionais. Tendo recebido pacificamente esses saberes, os alunos passam a reproduzir e sustentar a superestrutura opressora.
“A narração, de que o educador é o sujeito, conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em ‘vasilhas’, em recipientes a serem ‘enchidos’ pelo educador. Quanto mais vá ‘enchendo’ os recipientes com seus depósitos, tanto melhor educador será. Quanto mais de deixem docilmente ‘encher’, tanto melhores educandos serão. Desta maneira, a educação se torna um ato de depositar em que os educandos são os depositários e o educador, o depositante. Em lugar de comunicar-se, o educador faz ‘comunicados’ e depósitos que os educandos, meras incidências, recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis aí a concepção ‘bancária’ da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los. Nesta distorcida visão da educação, não há criatividade, não há transformação, não há saber”. (FREIRE, 1974)
Em outras palavras, se um professor chegar à sala de aula propondo dar uma aula de análise sintática, isso é uma forma de oprimir os alunos, pois tal conhecimento é pré-estabelecido e sistematizado. Tais conhecimentos pecam por não levar em conta a realidade do aluno e por não proporem reflexões críticas sobre essa condição social.. Percebe-se que Freire usa essa dicotomia de luta de classe dentro da educação, neste caso, “educação bancária” (cientificidade) X “educação libertadora”, como se aquela fosse a educação a favor da opressão burguesa e esta fosse a favor da educação revolucionária dos oprimidos. Auler e Delizoicov enfatizam essa tese:
A educação científica na maioria das escolas pode ser considerada como a educação bancária da concepção freireana, com a memorização de termos, sistemas e classificações. Educação neutra, não problematizadora, carrega consigo valores dominantes da tecnologia que têm submetido os interesses humanos àqueles puramente de mercado. Por isso, acaba sendo opressora, na medida em que reproduz um valor de ciência como um bem em si mesmo a ser consumido e aceito sem questionamentos (AULER & DELIZOICOV, 2006a).
Na concepção freireana, ensinar conteúdos clássicos, como gramática, aritmética, teorias epistemológicas e a cientificidade nas ciências naturais e exatas, é uma alienação. Se um professor de biologia disser que uma mulher é uma mulher, devido seu genótipo ser XX, isso pode ser considerado uma opressão-cientificista, pois, segundo os critérios pós-modernos, ser mulher é uma questão social, uma vez que não se nasce mulher, torna-se mulher; e não é a biologia que faz de um indivíduo mulher ou homem, mas sim sua condição de sujeito sócio-histórico; logo, usar a ciência da biologia para definir gênero é uma opressão segundo essa visão. Claro, todas as pessoas têm direito a definir o seu gênero social, já que isso é uma questão subjetiva delas, mas mesmo que elas mudem seus fenótipos, seus genótipos não serão mudados. Com efeito, a ciência não trabalha a favor da opressão ou dos burgueses; a ciência estabelece lógica e racionalidade a partir de fatos e evidências comprovadas de forma analítica e experimental que se chama conhecimento e método cientifico. A ciência não é um simples achismo intersubjetivo.
No capítulo dois do livro Pedagogia da Autonomia, intitulado “Ensinar não é transferir conhecimentos”, Freire continua a criticar o ensino bancário:
“Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção”. (FREIRE, 1996)
Paulo Freire utiliza o pensamento construtivista de Piaget e do socioconstrutivismo de Vygostky para formar sua pedagogia libertadora. De fato, as teorias pedagógicas atuais receberam influências da psicologia e da ciência cognitiva; algumas dessas teorias defendem que o conhecimento será construído no sujeito, ou seja, sua capacidade de adquirir saberes vai progredindo e evoluindo à medida que esse se desenvolve cognitivamente. O indivíduo vai amadurecendo psiquicamente e seu poder de aquisição dos conhecimentos vai expandindo e ficando mais aguçado com a influência que ele tem com o meio. Muitas dessas teorias são válidas hoje no meio educacional. Mas há conhecimentos fundamentais de base científica que os indivíduos precisam ter, isso porque a ciência, para ser refutada ou ampliada, tem que ser estudada. Ao criar sua teoria da relatividade, Einstein teve a princípio pensamentos hipotéticos, dedutivos e empiristas. Obviamente, a subjetividade esteve presente nas experiências e observações pessoais de Einstein ao lidar com o tema da gravidade (percebe-se que a teoria construtivista se encaixa nesse princípio). Entretanto, ele não ficou no simples “achismo interpretativo”. O grande cientista estudou os “saberes bancários e pré-estabelecidos” da física clássica e da matemática para formular, através da lógica e da racionalidade, a sua própria teoria. Como ressalta Renan Bardine, a ciência pode ser definida como:
O conjunto de conhecimentos baseados na reflexão, na observação e na experimentação. Dessa forma, teorias podem ser criadas, aperfeiçoadas, ou até abandonadas, para que a quantidade e a qualidade dos conhecimentos sejam ampliadas. Assim, as teorias de todos os ramos do conhecimento – Matemática, Biologia, Linguística, Arqueologia, Física etc. – podem e devem ser constantemente contestadas, examinadas, experimentadas, legitimadas ou substituídas. A ciência é, então, o ato de refletir e de se relacionar com o mundo, e isso qualquer pessoa pode fazer. Refletindo, experimentando e organizando, o homem constrói e transmite conhecimentos. A ciência desenvolvida nos laboratórios é apenas uma das maneiras de se “fazer ciência”. Para construir conhecimentos, é necessário pesquisar, refletir, observar, experimentar e validar ou refutar as teorias. (BARDINE, ….)
A ciência hoje é racionalista e construtivista, mas o método de fazer ciência não foi mudado. Formular novas teorias requer um estudo dos “conhecimentos bancários” para assim, como foi dito, contestar ou ampliar. Estudar disciplinas sistematizadas e positivistas é importante para dar a base de aprendizados mais complexos e amplos. Exemplo, escrever uma redação, que é um gênero textual, requer uma base de conhecimentos coesivos gramaticais como: pontuação, concordância, regência, etc., para que assim o texto possa ter coerência. Além disso, quem escreve tal gênero tem que compreender a tipologia textual, saber como ela se organiza e entender suas regras de escrita. Querendo ou não, tudo isso são conhecimentos que têm que ser transferidos de forma metódica e conteudista. Como é que um aluno irá fazer uma boa redação se não tiver esses conhecimentos linguísticos?
Mas para Paulo Freire, programar aulas a partir de conteúdos sistematizados e gradativos é lamentável.
“Fala-se quase inclusivamente de ensino dos conteúdos, ensino lamentavelmente quase sempre entendidos como transferência do saber” (FREIRE, 1996).
A postura freireana em relação à ciência moderna fica bem evidenciada no artigo de Jaime José Zitkoski e Raquel Karpinski Lemes, intitulado “O Tema Gerador Segundo Freire: Base para a Interdisciplinaridade”:
“Entretanto, os equívocos desse modelo científico reproduzem uma verdadeira opressão e desumanização sociocultural que é visível nas relações práticas da nossa vida em sociedade. […] São muitas as práticas que decorrem da compartimentalização do conhecimento e reproduzem a dualidade entre seres humanos considerados sujeitos (os que sabem e, portanto, “têm autoridade” para transmitir aos outros) e pessoas tratadas como objetos passivos que ignoram e, por isso mesmo, devem receber o saber de quem o possui. Esse é o modelo sociocultural enraizado numa visão epistemológica egocêntrica, autoritária e grosseiramente equivocada em seus fundamentos filosófico-científicos. A menção de alguns exemplos acima relacionados apenas aponta para os graves equívocos epistemológicos que estão ainda hoje na base de sustentação de grande parte das produções culturais sistemáticas como, ‘por exemplo, as teorias científicas e o domínio da tecnocracia que hoje impera no mundo”. (ZITKOSKI & LEMES, …)
- Para Paulo Freire, os conteúdos têm que ser temas geradores. Mas afinal, o que são temas geradores?
Freire afirma que a “educação bancária” (educação clássica) é opressora e não é uma forma de transmitir saber crítico, mas de depositar conteúdos sistematizados para reproduzir a sociedade dos opressores. Daí a proposta de uma educação libertadora, uma educação que valoriza os conhecimentos sociais e de mundo dos educandos e os conscientizariam de suas realidades políticas-sociais.
As etapas básicas do método freireano são:
- Etapa de investigação: busca conjunta entre professor e aluno das palavras e temas mais significativos da vida do aluno, dentro de seu universo vocabular e da comunidade onde ele vive.
2. Etapa de tematização: momento da tomada de consciência do mundo, através da análise dos significados sociais dos temas e palavras.
3. Etapa de problematização: etapa em que o professor desafia e inspira o aluno a superar a visão mágica e acrítica do mundo, para uma postura conscientizada.
Freire propõe que a “construção dos saberes” deve partir da realidade de mundo do educando. De fato, o processo da assimilação é bem utilizado no início do ensino e aprendizado. A utilização de objetos e/ou coisas da realidade do aluno nas exemplificações o ajuda a compreender e aprender melhor o novo conteúdo. Exemplo, caso alguém fosse ensinar uma criança da zona rural a somar, a utilização de frutas para ajudar a criança a compreender o processo inicial de fazer adição o levará a entender melhor ou com facilidade esse cálculo matemático (se tenho duas mangas e ganho mais duas ficou com quantas mangas? Fico com quatro mangas), mas lembrando de que isso é apenas temporário, pois o aluno deve compreender a fazer esse cálculo ou qualquer outro sem precisar de um objeto concreto, ele tem que calcular mentalmente.
Mas Paulo Freire quer que esses objetos sejam tematizados para assim discutir a realidade dos alunos no que ele chama de educação dialógica.
“A educação dialógica se baseia no diálogo e o diálogo começa com a busca do conteúdo programático. […] Paulo Freire recomenda que seja formado um grupo de educadores pesquisadores que observará os educandos e conversará com eles, em situações diversas, para conhecer sua realidade e identificar o que ele chama de temas geradores, que possibilitarão a tomada de consciência dos indivíduos. Haverá reuniões com a comunidade, identificação de voluntários, conversas e visitas para compreender a realidade, observações e anotações. Os investigadores farão um diagnóstico da situação. Então discutirão esse diagnóstico com membros da comunidade para avaliar o grau de consciência deles. Constatando que esse nível é baixo, vão apresentar as situações identificadas aos alunos, para discussão e reflexão, com o objetivo de despertar sua consciência para sua situação de opressão. Se o pensamento do povo é mágico (religioso) ou ingênuo (acredita nos valores de direita), isso será superado pelo processo, conforme o povo pensar sobre a maneira que pensa, e conforme agir para mudar sua situação de opressão”. (CENTENARO, 2015).
A tal “consciência crítica” que Paulo Freire quer promover com esse diálogo não é nada menos que manipulação política e ideológica. Quando Freire utilizou esse pensamento para alfabetizar os cortadores de cana potiguares, o fez propagando o pensamento marxista. Freire pegava uma palavra da realidade do aluno (“trabalho”, por exemplo), alfabetizava esse aluno através do método de Frank Laubach, e depois discursava para aqueles analfabetos sobre como trabalho era uma ferramenta de opressão empregada por seus patrões, sobre como eles deveriam assumir posturas revolucionárias para saírem da opressão, etc…
Agora, pergunte a si mesmo: essa tal consciência crítica, formada desse modo, ajudará mesmo os alunos a se libertarem da sua ignorância e os estimulará a buscar e evoluir no domínio do conhecimento, ou servirá sobretudo para transformá-los em militantes da causa ideológica marxista, em mera massa de manobra? Como é que pessoas que nem sequer sabem ler e escrever, entenderão, no ato mesmo de serem alfabetizados, assuntos políticos, governamentais e trabalhistas altamente complexos? Não será o estudo aprofundado justamente um pré-requisito para ser capaz de formar opinião sobre esses assuntos?
O que acontece é que esses indivíduos serão usados para serem peões de ideologia de esquerda, ou de qualquer outra ideologia, pois, quando o professor utiliza esse pensamento pedagógico, ele quer que o aluno milite pela causa dos seus ideais ideológicos e políticos. Não houve realmente conscientização. A tomada de consciência só ocorre quando se tem pluralismo de ideias para que o aluno, de forma lógica, crítica e racional, tome seu posicionamento. Os alunos não foram levados a pensar intelectualmente sobre assunto. Faltou pesquisa, faltou estudar os prós e os contras dessa ideologia, faltou senso racional, faltou o método cientifico. E é isso que Freire quer: um dialogismo pobre de objetividade e cheio de achismos intersubjetivos.
“Freire não adota uma concepção intelectualista, ou racionalista do conhecimento. O conhecimento engloba a totalidade da experiência humana. O ponto de partida é a experiência concreta do indivíduo, em seu grupo ou sua comunidade. Esta experiência se expressa através do universo verbal e do universo temático do grupo. As palavras e os temas mais significativos deste universo são escolhidos como material para (…) a elaboração do novo conhecimento, partindo da problematização da realidade vivida” (ANDREOLA, 1993, p. 33).
“Ora — escreve Luís Lopes Diniz Filho — isso é apenas a dita ‘educação bancária’ camuflada de diálogo! O professor apresenta uma única via para explicar as situações relatadas pelos alunos: a ideologia em que ele acredita. O aluno é deixado na ignorância sobre a existência de pesquisas que explicam as situações de pobreza, desigualdade, problemas urbanos e ambientais, entre outros, fora do universo teórico e ideológico do professor. O próprio simplismo do pensamento de Paulo Freire permite exemplificar como isso se dá. Suponham que um aluno de Freire, um operário em processo de alfabetização, convidado a falar sobre sua vida cotidiana, dissesse que está desempregado. Aproveitando a oportunidade para “conscientizar” o aluno, o professor Freire apresentaria a sua visão sobre o tema: ‘O desemprego no mundo não é, como disse e tenho repetido, uma fatalidade. É antes o resultado de uma globalização da economia e de avanços tecnológicos a que vem faltando o dever ser de uma ética realmente a serviço do ser humano e não do lucro e da gulodice irrefreada das minorias que comandam o mundo’ (a citação é de Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa) É claro que o aluno hipotético só poderia contestar essa análise se tivesse lido trabalhos de economistas sobre as causas do desemprego. Entretanto, o aluno obviamente não leu nada disso, pois está se alfabetizando! Ou seja, o aluno não tem nem poder nem espaço para ‘questionar os novos saberes’ apresentados pelo professor”.
Considere-se outro possível tema gerador, mais apropriado ao momento político, a “Reforma da previdência social”. O professor de português freireano dará a sua aula baseando-se em um artigo de opinião publicado em uma revista que se posiciona de forma enviesada contra a reforma. Pedirá a seus alunos que leiam essa matéria e, em seguida, atuando como simples “mediador” do conhecimento, fará um discurso sobre como a reforma é ruim e como vai acabar com os direitos das mulheres, negros, homossexuais, estudantes etc.. Dirá também aos alunos que eles precisam se posicionar contra essa reforma, pois serão diretamente afetados por ela. E, por fim, após ter “conscientizado” seus alunos (entenda-se, após tê-los doutrinado!), pedirá que eles escrevam um trabalho com o seguinte título: “Como a reforma da previdência prejudicará o Brasil?”. Obviamente, bons entendedores que são quando o assunto é avaliação escolar, os alunos se sentirão obrigados escrever o artigo de acordo com o tema que o professor colocou, posicionando-se a favor do pensamento do seu mestre. Desse modo, o professor doutrina os alunos impondo suas convicções ideológicas, políticas e partidárias (sem ter de recorrer a qualquer ameaça explícita).
“Neste sentido, o bom professor é o que consegue, enquanto fala, trazer o aluno até a intimidade do movimento do seu pensamento”
(FREIRE, 1996)
Freire afirma que o educador tem que ser um revolucionário, um agente de transformação social.
Paulo Freire enfatiza que o revolucionário não pode manipular os educandos. Todo o processo tem de ser construído baseado no diálogo e no respeito entre os líderes e o povo. Porém, os líderes devem ter a prudência de não confiar no povo, porque as pessoas oprimidas têm a opressão inculcada no seu ser. Como exemplo de um líder que jamais permitiu que seu povo fosse manipulado, Paulo Freire apresenta Fidel Castro. […] Paulo Freire afirma que os oprimidos devem ser reconhecidos como Pedro, Antônio, Josefa, mas os chama o tempo todo de “massas”. Diz que valoriza a visão de mundo do povo, enquanto não perde uma oportunidade de desdenhar das crenças religiosas desse mesmo povo, chamando-as de mágicas, sincréticas ou mistificações. (CENTENARO, 2015).
Interessante que, de acordo com Centenaro, Freire afirma que “a educação bancária” é uma tomada opressiva dos conhecimentos das comunidades locais, e ainda afirma que é uma invasão cultural. Mas quando a educação é libertadora e pretende transformar indivíduos em revolucionários vale tudo, inclusive forçá-los a superar suas culturas.
- Para Paulo Freire, a educação é uma conscientização política. Mas o que seria essa conscientização política?
Para Paulo Freire, a maior consciência que o educando pode e deve almejar é reconhecer-se oprimido, alguém que precisa se rebelar contra o sistema educacional bancário e opressor, contra o capitalismo opressor e suas superestruturas. Para isso, pode e deve se valer de uma educação humanista e libertadora, isto é, do dialogismo focado em temas geradores; diálogo que cria uma nova “ciência” intersubjetiva negadora da ciência objetivista.
Deixo claro que, em minha opinião, pode-se e deve-se falar de política nas escolas, pois é na escola que se aprende sobre as ideologias e teorias políticas. Mas o que ocorre atualmente é a hegemonia de uma orientação político-ideológica de viés marxista dentro dos institutos educacionais.
“Contra toda forma do discurso fatalista neoliberal pragmático e reacionário insisto hoje sem desvios idealistas na necessidade de conscientização […] Sou professor contra a ordem capitalista vigente que inventou esta aberração: a miséria na fartura”. (FREIRE, 1996)
Contra essa pedagogia militante de Freire, posicionam-se alguns teóricos:
“Algumas pessoas que trabalharam com Freire estão começando a compreender que os métodos dele tornam possível ser crítico a respeito de tudo, menos desses métodos mesmos”. (BOSTON, 1972).
“Ele deixa questões básicas. Não poderia a “conscientização” ser um outro modo de anestesiar e manipular as massas? Que novos controles sociais, fora os simples verbalismo, serão usados para implementar sua politica social? Como Freire concilia a sua ideologia humanista e libertadora com a conclusão lógica da sua pedagogia, a violência da mudança revolucionária? (FETTERMAN, 1986).
CONCLUSÃO
O pensamento pedagógico de Paulo Freire não passa de um pensamento revolucionário dirigido à formação de professores doutrinadores e alunos militantes. A dialética que ele propõe é de uma consciência coletiva que critica a ciência, os valores sociais e a Constituição, contestada em nome da “democratização”. O pensamento de Freire está de acordo com dos neomarxistas da escola de Frankfurt. Alimenta a crítica pela crítica e perde-se na intersubjetividade. Fica a indagação: será que esse modelo pedagógico é adequado para um verdadeiro processo de ensino aprendizagem? Ou será ele, sobretudo, um método de propaganda política, ideológica e partidária?
A consciência e a criticidade só podem vir a partir da análise dos diversos pontos de vistas e da pluralidade teórica disputada mediante uma lógica argumentativa rigorosa. O aluno deve ter menos “espírito crítico”, no sentido freireano, e mais racionalidade-crítica!
* Jonas da Silva Azevedo
é graduando em Letras com habilitação em Português e Espanhol pela Universidade Estadual do Maranhão
* Artigo publicado em 4 de julho de 2019.
REFERÊNCIAS
https://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A9todo_Paulo_Freire
ANDREOLA, Balduino A. O Processo do Conhecimento em Paulo Freire. Educação e Realidade, Vol.18, nº1, p. 32-45, jan-jul/1993.
BECKER, Fernando. Da ação à operação: O caminho da aprendizagem em Piaget e Freire. Porto Alegre : Palmarinca, 1993 .
BOSTON, Bruce O, “Paulo Freire” em Stanley Grabowski, ed., Paulo Freire, Syracuse University Publications in Continuing Education. 1972.
CENTENARO, Marcelo. Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire, resenha crítica 2015.
FETTERMAN, David M., “Review of the Politics of Education”, American Anthropologist, Março 1986
FILHO, Luiz Lopes Diniz Filho. Paulo Freire e a “educação bancária” ideologizada. Artigo. Escola Sem Partido.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e terra, 1993.
________ Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e terra, 1996.
VYGOSTKY, LEV. Linguagem e Pensamento. Ed Antídoto. 1979
ZITKOSKI, Jaime José e LEMES, Raquel Karpinski. O Tema Gerador Segundo Freire: base para a interdisciplinaridade.
https://www.coladaweb.com/curiosidades/o-que-e-ciencia 11/05/2019.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Albert_Einstein 11/05/2019.
https://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A9todo_Paulo_Freire 11/05/2019.