Foi assinada pelo presidente Jair Bolsonaro a Medida Provisória 881/2019, da Liberdade Econômica. A MP 881 retoma o desafio do Programa de Desburocratização proposto e executado por meu pai, Helio Beltrão, ministro da Desburocratização nos anos 1980.
O Programa de Desburocratização original se dedicou ao pequeno: o cidadão comum e o pequeno empreendedor.
Afinal, é o pequeno quem mais perde tempo e dinheiro nas filas dos guichês e nos cartórios, os quais, além de gerarem dias de trabalho perdidos, são a própria definição do estrangulamento de sua iniciativa empreendedora. O rico, por outro lado, consegue se defender recorrendo a despachantes; já a grande empresa possui batalhões de contadores e advogados.
Ou seja, nem todos são iguais perante a burocracia. A burocracia é agente primordial de desigualdade de oportunidade entre os brasileiros.
Durante a vigência de cinco anos, o Programa de meu pai eliminou mais de 1 bilhão de documentos e atestados, reduziu drasticamente as visitas aos cartórios, instituiu o conceito legal de micro e de pequena empresa, aliviando-as de impostos e exigências (hoje, incorporado ao Simples Nacional), e criou os Juizados de Pequenas Causas, em que disputas de até 20 salários-mínimos dispensam a necessidade de advogado.
Após a saída do ministro, os entraves voltaram a infernizar o pequeno empreendedor, em parte devido à ação de interesses poderosos (como as máfias dos alvarás), mas também por conta da cultura de centralismo e desconfiança. Regressou o pressuposto de que o cidadão mente sempre, até prova-carimbo em contrário.
E assim, em vez de se punir com o Código Penal os 0,1% de falsários e corruptos, a sociedade foi inundada com procedimentos, autenticações, alvarás e selos, que por si sós causam mais corrupção e danos do que a alternativa com menos papelório.
Cabe mencionar que, mais adiante, iniciativas pontuais foram tentadas, mas faltou à cúpula do governo vontade política para prosseguir. A burocracia é como unha: é preciso cortar toda semana.
Com a eleição de Jair Bolsonaro e a recente ascensão das ideias mais liberais, a cúpula do governo retomou o firme compromisso com a desburocratização. A MP 881 reformula o arcabouço normativo de forma a beneficiar em particular o pequeno empreendedor.
Entre outras disposições, a MP 881 estabelece a liberdade de empreender para sustento próprio, e elimina as autorizações do estado para atividades de baixo risco. Caem, portanto, os alvarás de funcionamento, sanitário, dos bombeiros, e ambiental. São beneficiados, entre outros, as costureiras, escritórios de TI, bancas de jornal, food trucks, sapateiros, e quiosques em shoppings.
Adicionalmente, no caso de empreendimentos em que esteja prevista autorização prévia pelo estado, estabelece um prazo-limite após o qual o licenciamento será concedido automaticamente. Estão vedadas, portanto, protelações indevidas pelo órgão público.
A MP 881 inclui outros dispositivos desburocratizantes: o acesso das pequenas e médias empresas à bolsa de valores foi facilitado; a legislação passa a ser interpretada no sentido mais favorável ao cidadão; e introduziu-se a “análise de impacto regulatório” para novas normas.
Conjugada com o CNPJ imediato no ato de registro da empresa, determinado pela MP 876, bem como com a extinção do reconhecimento de firma estabelecido pela lei 13.726, a MP 881 retoma a ênfase na luta contra a burocracia.
Há desafios para a ampla adoção, no entanto. É fundamental que a sociedade se engaje na conscientização sobre as novas regras, pois a batalha é predominantemente cultural. No curto prazo, só podemos esperar que o Congresso Nacional sancione a MP em muito breve.
Publicado originalmente no jornal Folha de S. Paulo