Estado Bandido

Maria Lucia Victor Barbosa
02/10/2019

Não discorrerei sobre a longa evolução do Estado nem farei a análise da difícil coexistência das formas do Estado de Direito com os conteúdos do Estado Social. Porém, é importante conceituar o contemporâneo Estado Democrático de Direito como uma estrutura formal do sistema jurídico, garantidora das liberdades fundamentais com aplicação da lei geral-abstrata por parte de juízes independentes.

A conceituação é importante no sentido de estabelecer contraste com o Estado Bandido o qual, paradoxalmente, emerge dos Poderes constituídos.

Afinal, a estância mais alta do Legislativo, o STF, tem estado longe de aplicar a lei geral-abstrata por parte de juízes independentes, o que garantiria liberdades fundamentais e a isonomia do Direito.

Além disso, o Supremo vem demolindo a machadadas a Lava Jato, maior operação anticorrupção havida no país e que teve à frente o então juiz, Sergio Moro, raro homem da lei e atual ministro da Justiça e da Segurança Pública.

Foi um trabalho que não só exigiu competência como coragem. Coragem para prender poderosos. O máximo da coragem para enviar à cadeia o chefão Lula da Silva, o grande institucionalizador da corrupção.

Os adeptos do Estado Bandido chamam a Lava Jato de Estado Policial e, juntando-se ao PT concentram seu ódio em Moro. Não importa que a condenação de Lula da Silva, relativa ao tríplex de Guarujá, tenha sido confirmada unanimemente pelo TRF-4 e o STJ. Moro é o culpado do crime de lesa-majestade. E a meta e soltar o presidiário dando troco no juiz parcial.

Que o PT aja assim é do seu feitio violento e vingativo, mas, e o STF? Entre outras ações dos juízes supremos lembremos do caso do ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobrás, do governo Dilma Rousseff, Aldemir Bendine que afanou o que pode. Pois bem, obteve sentença favorável na Segunda Turma do STF, o que derrubou a condenação de Sergio Moro.

Na sequência veio o habeas corpus do ex-gerente da Petrobrás, Márcio de Almeida Ferreira, baseado na mesma filigrana jurídica usada pela defesa de Bendine. Foi alegado que Ferreira não pode apresentar as alegações finais após manifestações dos réus colaboradores. Estava aberto o caminho para soltar o chefão petista e demais bandidos.

 

 

Em 26 de março aconteceu uma das mais vigorosas machadadas na Lava Jato. Por sete votos o STF criou uma regra que não existe na Constituição ou seja:  réus delatados têm o direito de falar por último no caso em que também existam réus que fecharam acordos de colaboração premiada.

Tal tese pode anular uma série de sentenças da Lava Jato, beneficiando bandidos de colarinho branco, o que inclui Lula no caso do sítio de Atibaia. E, naturalmente, membros do PCC e do CV.

O Congresso não fica atrás quando se trata de erigir o Estado Bandido. Enquanto o pacote anticrime do ministro Moro jaz em alguma gaveta, suas excelências geraram a Lei de Abuso de Autoridade. Não vou entrar em detalhes da monstruosidade legislativa, mas apenas resumi-la: é proibido prender. Portanto, graças aos que elegemos como nossos representantes estamos à mercê de facínoras de todas as espécies.

Para citar mais uma vergonha nacional revejo a patacoada do ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Antecedendo o lançamento de seu livro de memórias, Janot buscou os meios de comunicação para dar uma entrevista. Nesta afirmou, que em 2017 foi ao Supremos para matar o ministro Gilmar Mendes e em seguida suicidar. Só não conseguiu seu intento porque a mão de Deus o segurou. Na linguagem lulista pode-se dizer: “menas”, ex-procurador-geral, “menas”, pois isso parece algo excessivamente rocambolesco.

Diante do estupor que as entrevistas causaram, uns disseram que o homem é louco. Outros que tudo não passou de marketing para atrair atenção para o livro. Seja como for, Janot esteve longe de exercer sua alta função com parcialidade. Armou uma cilada para o ex-presidente Temer com a gravação não autorizada e fajuta de Joesley Batista. Pediu ao STF a prisão de Delcídio do Amaral, que sendo senador tinha foro privilegiado, no que foi atendido. Enfim, perseguiu aqueles dos quais não gostava.

Da sua suíte da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, Lula anuncia que não aceita prisão domiciliar. Ordena que o Supremo considere Moro parcial para que assim seja inocentado e dono novamente de seus direitos políticos. Acrescenta que nada o faria mais feliz do que assim ser solto e ver Moro e Dallagnol irem para a cadeia.

Pode ser que os ministros do Supremo, que Lula certa vez chamou de acovardados, obedeçam a tal ordem. Pode ser também que a mais alta corte da Justiça volte atrás e diga que não pode haver prisão em segunda instância.

Desse modo, tênues fios de esperança vão se dissipando enquanto sensações de revolta, vergonha e impotência tomam conta de nossos sentimentos. Pobre Brasil! Pobres gerações futuras!

 

 

Maria Lucia Victor Barbosa é socióloga.

mlucia@sercomtel.com.br

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