Karl Friston
O renomado cientista britânico afirma que a “população suscetível efetiva nunca foi 100%”. Os modelos da epidemia teriam errado ao assumir que a maioria das pessoas não tem alguma imunidade ao novo coronavírus. No Reino Unido, cerca de 80% da população não seria suscetível ao SARS-CoV-2, diz Friston
Reprodução © Youtube/Serious Science
Frontliner
06.06.2020
Há apenas um mês, a ideia de que a maioria das pessoas não é suscetível ao Covid-19 seria considerada negacionismo.
No início de maio, o Professor de Stanford e Prêmio Nobel Michael Levitt afirmou à Freddie Sayers, em entrevista ao LockdownTV/UnHerd, que as curvas de crescimento da doença nunca foram realmente exponenciais, sugerindo algum tipo de “imunidade anterior”.
Hoje, porém, evidências de algum nível de resistência e imunidade anteriores à Covid-19 estão presentes em artigos publicados revisados por pares. Por exemplo, o estudo Targets of T Cell Responses to SARS-CoV-2 Coronavirus in Humans with COVID-19 Disease and Unexposed Individuals, publicado em meados de maio na revista científica Cell, da Elsevier, sugere que 40% a 60% das pessoas não expostas têm resistência de outros coronavírus.
“É importante ressaltar que detectamos células T CD4+ reativas ao SARS-CoV-2 em 40% a 60% dos indivíduos não expostos, sugerindo o reconhecimento de células T reativas cruzadas entre coronavírus circulantes de resfriado comum e SARS-CoV-2″, diz o artigo.
Células CD8+ e CD4+ específicas para SARS-CoV-2 foram identificadas em ?70% e 100% dos pacientes convalescentes com Covid-19. Células CD4+ reativas ao SARS-CoV-2 foram detectadas em ~40% a 60% de indivíduos não expostos. © Alba Grifoni et al., Elsevier Inc
São quatro os coronavírus responsáveis pelo resfriado comum: Alpha coronavírus 229E e NL63, Beta coronavírus OC43 e o HKU1. Eles circulam por todo o mundo. A maioria das pessoas se infecta com os coronavírus comuns ao longo da vida, sendo as crianças pequenas mais propensas a se infectarem.
Agora, de um membro proeminente do SAGE, o grupo criado para desafiar os pareceres científicos do governo britânico, vem a afirmação de que a parcela das pessoas que não são suscetíveis ao Covid-19 pode chegar a 80%.
O professor Karl Friston, como Michael Levitt, não é um virologista; sua experiência é compreender processos biológicos complexos e dinâmicos, representando-os em modelos matemáticos. No campo da neurociência, ele foi classificado pela revista Science como o mais influente do mundo. É regularmente citado como um cientista que provavelmente será agraciado com um Nobel.
Friston inventou uma técnica chamada de “mapeamento paramétrico estatístico” para entender a imagem cerebral e, nos últimos meses, ele vem aplicando seu método particular de análise bayesiana, que ele chama de “modelagem causal dinâmica”, aos dados disponíveis da Covid-19.
“Até o momento, nossas previsões foram precisas dentro de um ou dois dias; portanto, há uma validade preditiva em nossos modelos que os convencionais não possuem”, explicou Friston ao The Guardian.
Seus modelos sugerem que a grande diferença entre os resultados no Reino Unido e na Alemanha, por exemplo, não é primariamente um efeito de diferentes ações governamentais, mas é melhor explicada pelas diferenças entre as populações, que fazem a “população suscetível” da Alemanha muito menor do que no Reino Unido.
“O fato é que o alemão médio tem menos probabilidade de ser infectado e morrer do que o britânico médio. Por quê? Existem várias explicações possíveis, mas uma que parece cada vez mais provável é que a Alemanha tenha mais “matéria escura” imunológica – pessoas que são impermeáveis à infecção, talvez porque estejam geograficamente isoladas ou tenham algum tipo de resistência natural. É como a matéria escura no universo: não podemos vê-la, mas sabemos que deve estar lá”, especulou.
A matéria escura específica mencionada acima compreende um subconjunto da população que participa da epidemia de uma maneira que os torna menos suscetíveis à infecção – ou menos propensos a transmitir o vírus. Esse tipo de matéria escura representa um desvio das abordagens epidemiológicas básicas de doenças infecciosas que assumem 100% de suscetibilidade da população.
“Tecnicamente, a evidência para essa matéria escura é esmagadora; no sentido de que a evidência (também conhecida como probabilidade marginal) de modelos com essa subpopulação é muito maior do que a evidência de modelos equivalentes sem ela”, escreve Friston.
O cientista destaca que uma vez que se incorpora no modelo comportamentos que as pessoas adotam de qualquer maneira, como ficar na cama quando estão doentes, o efeito do lockdown “literalmente desaparece”.
Sua explicação para os resultados de mortalidade notavelmente semelhantes na Suécia (sem lockdown) e no Reino Unido (lockdown total) é que “eles não eram realmente diferentes. Porque no final das contas, os processos reais que entram na dinâmica epidemiológica – os comportamentos reais, o distanciamento, foram especificados evolutivamente pela maneira como nos comportamos quando temos uma infecção”.
Isso significaria que a principal suposição subjacente por trás dos lockdowns, tipificada pelas famosas previsões do Imperial College – sem controle a doença contaminaria toda a população de todos os países e mataria cerca de 1% dos infectados, levando a incontáveis milhões de mortes em todo o mundo – estava errada, por um grande fator.
Contudo, Friston disse que as premissas dos modelos de Neil Ferguson estavam todas corretas, “sob a qualificação de que a população de quem eles estavam falando é muito menor do que você imagina”. Em outras palavras, Ferguson estava certo de que cerca de 80% das pessoas suscetíveis seriam rapidamente infectadas, e estava certo de que entre 0,5% e 1% morreria, mas não percebeu que a população suscetível era apenas uma pequena parcela de pessoas no Reino Unido e uma parcela ainda menor em países como a Alemanha e outros países.
O que muda tudo.
Em circunstâncias normais, a maioria das pessoas nunca irá contrair a doença.
Naturalmente, cenários com uma carga viral muito alta, como médicos que tratam pacientes com Covid-19 em hospitais, podem vencer essas defesas.
A maior ação governamental coordenada da história, fechando à força a maioria das sociedades do mundo com consequências que podem durar gerações, teria sido baseada em ciência falha.
Os efeitos colaterais na América já podem ser mais mortais do que a pandemia.
Scott Atlas, da Hoover Institution, estima que as conseqüências do desemprego, da falta de consultas médicas e de outros fatores durante os dois meses de lockdown levarão a tantas mortes extras que os americanos perderão 1,5 milhão de anos acumulados de vida, o dobro do total perdido até o momento com a Covid-19.
* Com informações da LockdownTV/UnHerd, The Guardian, Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT), City Journal, Hoover Institution
Leitura recomendada:
- Vacina de Oxford não protege contra Covid(06/2020)
- Lockdown: ciência falha está devastando o Reino Unido(06/2020)
- China enfrenta segunda onda de coronavírus(06/2020)
- Prêmio Nobel diz que previsões de casos de Covid estão erradas(05/2020)
- P. Morgan: lockdown é mais devastador do que Covid-19(05/2020)
- Governo da Noruega descarta lockdown em nova onda de Covid(06/2020)
- Lockdown: “Você não pode aprisionar uma população”(05/2020)
- Cloroquina não salva vidas e não reduz tempo de internação(06/2020)
- Suécia ignora OMS e evita recessão(04/2020)
- Governo suiço abandona multa por violação de distanciamento social(06/2020)
- Covid-19 deixa de ser contagiosa após 11 dias, afirmam entidades médicas(05/2020)
- Coronavírus SARS-CoV-2 tem 7.237 mutações; D614G é a mais comum(05/2020)
- Israel anuncia cura para Covid-19(05/2020)
- Cientistas afirmam que após isolamento seguirá nova onda de casos de Covid-19(04/2020)
- Surtos do novo coronavírus serão anuais, diz a Academia Chinesa de Ciências Médicas(04/2020)
- Estudos trazem novas evidências da transmissão do vírus SARS-CoV-2(05/2020)
- Governo britânico diz que testes de anticorpos não funcionam(04/2020)
Veja também:
- Escândalo no Japão: rede de TV e jornal publicaram série de 14 pesquisas de opinião fraudadas sobre o governo e o combate à pandemia(06/2020)
- Itália, Alemanha, França e Holanda negociam 400 milhões de doses da vacina para Covid da AstraZeneca(06/2020)
- Produção industrial brasileira caiu 19% em abril de 2020(06/2020)
- Dólar retorna ao nível de antes da pandemia(06/2020)
- Brasil começa a testar vacina para Covid da AstraZeneca(06/2020)
- Serviço secreto alemão diz que OMS minimizou Covid atendendo pedido da China(05/2020)
- Teste de coronavírus na saliva é preciso, prático, seguro, e mais barato(05/2020)
- Merkel aposta em campeões nacionais e capitalismo de Estado para recuperar a economia da Alemanha(06/2020)
- Pequim: US$ 1,7 bilhão em cupons para reativar economia da cidade(06/2020)
- Tóquio e Osaka liberam cinemas, bares, clubes noturnos, academias(05/2020)
- EUA e Reino Unido garantem 400 milhões de doses de vacina para Covid-19 (05/2020)
- Coronavírus persiste em máscaras faciais por mais de 7 dias(04/2020)
- Vírus projetado pela tosse atinge seis metros e pelos espirros oito(04/2020)
- Contágio por coronavírus é mais rápido no Brasil, diz Paulo Guedes(03/2020)
- FDA suspende teste gratuito de Covid-19 de Bill Gates(05/2020)
Copyright © Frontliner. Todos os Direitos Reservados. All Rights Reserved.