Quem era os caifazes?
Um dos exemplos do abolicionismo popular foram os Caifazes, que se organizaram na província de São Paulo após 1880. Liderados pelo advogado, ex-delegado, ex-promotor e ex-juíz Antônio Bento de Souza e Castro (1843-1898) – portanto um membro da elite paulista –, os Caifazes participaram da organização de uma série de fugas das fazendas cafeeiras e mesmo nas cidades. O nome deriva do personagem bíblico que corrompeu Judas para trair Jesus. No caso brasileiro, os Caifazes estavam promovendo a traição à escravidão.
Apesar dessa liderança de Antônio Bento, os Caifazes eram formados em sua maioria por tipógrafos, artesãos, pequenos comerciantes e ex-escravos, que constituíram redes de solidariedade para garantir a saída dos escravos das fazendas e sua inserção no mundo do trabalho. É de se destacar a atuação do caifaz Antônio Paciência, que ficou notabilizado pela atuação no interior de São Paulo na organização e planejamento de fugas.
Em razão do perigo que essas ações representavam, as autoridades impuseram censura à imprensa da época, segundo eles, para que o pânico não se espalhasse, mas os inquéritos e outros documentos policiais possibilitaram aos historiadores trazerem à tona essas histórias que os escravocratas pretendiam deixar esquecidas.
As redes incluíam desde os chamados “cometas”, caixeiros-viajantes que se deslocavam pelo interior paulista e estimulavam as fugas em suas passagens pelas fazendas, quanto os trabalhadores das ferrovias, que possibilitavam o transporte dos escravos fugidos.
Nesse último caso, as ferrovias que foram construídas para aumentar a produtividade e a riqueza da cafeicultura baseada no trabalho escravo auxiliaram na luta contra a escravidão ao garantir o veículo de fuga para os cativos.
Os principais locais de refúgio dos fugidos eram as cidades de São Paulo e de Santos. Nessa última, destacou-se o Quilombo do Jabaquara, que chegou a abrigar cerca de 10 mil escravos fugidos. O Quilombo era coordenado pelo ex-escravo sergipano Quintino de Lacerda e pelo português Santos “Garafão”.
Além de refugiar os escravos fugidos, as pessoas envolvidas com o Quilombo do Jabaquara conseguiam arrumar empregos a eles em razão da ligação com vários comerciantes e proprietários de outros tipos de empresas, que eram simpatizantes da abolição.
Com esse tipo de ação, os Caifazes mostraram-se o setor mais avançado do movimento abolicionista, auxiliando o fomento das inquietações e conflitos entre escravos e senhores nos locais de trabalho nas fazendas e cidades. A união entre o abolicionismo popular e as ações executadas pelos escravos em busca de sua liberdade constituiu o principal fator para o encerramento da escravidão no Brasil, rompendo por dentro uma estrutura social que durava já quase há quatro séculos.
Por Tales Pinto
Mestre em História