Plínio A. V. Lins.
30.08.2020
No seu quilométrico voto no inquérito sobre as Fake News, o ministro-relator Edson Fachin usou cerca de 1/3 do tempo em citações à justiça americana. Faltou fazer também algumas comparações: os nove juízes da Suprema Corte dos EUA ganham um salário fixo que lhes permite uma vida bastante digna e confortável, e mais nada. Cada um deles tem direito a quatro (isso mesmo, somente quatro) assessores, assim mesmo, temporários, com “mandato” de um ano. Não há auxílios para moradia, paletó ou combustível. Só o presidente da Corte tem carro oficial com motorista, enquanto os demais têm direito apenas ao uso de uma vaga na garagem do Tribunal.
Uso de jatinhos? Nem pensar! Discutem apenas temas relacionados às leis federais, incluindo a Constituição americana, algo facilitado por ter apenas sete artigos e se manter inalterada há 233 anos, exceto pela inclusão de 27 emendas, inclusive a que proíbe o Congresso de votar leis com qualquer tipo de censura à imprensa ou à liberdade de expressão e de manifestação.
Os julgamentos obedecem a uma severa rotina: ouvidas as partes e testemunhas e cotejadas as provas, os juízes se reúnem a portas fechadas, sozinhos, proibindo-se até os assessores de entrar para oferecer água. Obtido o consenso, o lado vencedor fica encarregado de redigir o Acórdão, só então anunciado em plenário. É simples assim o funcionamento da Corte Suprema da mais rica potência democrática do mundo!
Não se discutem Habeas Corpus a políticos ou empresários, até porque na América nem o presidente da República tem foro privilegiado. Todos são julgados pela justiça comum e podem ser detidos logo após a decisão em primeira instância, aguardando presos o julgamento de recursos. A imensa maioria do povo americano não conhece os rostos desses ministros nem sabe seus nomes, até porque juiz lá não dá entrevistas, fica longe dos holofotes, não fala fora dos autos e jamais se manifesta sobre assuntos ou pessoas, justamente pela possibilidade de que um dia possa vir a julgá-los.
Raríssimas são as decisões monocráticas e não se aplicam a temas que afetem direta e profundamente a vida dos cidadãos. Por esse conjunto admirável de características positivas, principalmente o distanciamento seguro da política, é uma Corte extremamente respeitada, inexistindo motivos para manifestações contrárias à sua existência. No Brasil, já tivemos oito Cartas Magnas e somente a última, de 1988, já sofreu 53 emendas! Mudou-se a jurisprudência exclusivamente para soltar corruptos condenados em segunda instância.
Manifestações legítimas e ordeiras em Brasília, com as famílias vestindo verde e amarelo, a favor de Bolsonaro, foram taxadas, inclusive no voto de Fachin, de antidemocráticas e inconstitucionais por exibirem cartazes pedindo o fechamento do STF e do Congresso. Já os quebra-quebras em São Paulo e Curitiba, onde inclusive foi rasgado, pisado e queimado o nosso maior símbolo, a bandeira nacional e houve dezenas de ofensas ao presidente, além de faixas incitando o golpe para tirar Bolsonaro de um dos poderes constituídos da República, foram consideradas democráticas pela mídia e mereceram um sonoro silêncio de todos os membros da Suprema Corte. Por quê?
Segundo o voto do relator Fachin, eu posso ser processado se uma das excelências julgar este texto ofensivo, mas o decano Celso de Mello pode taxar de nazistas os bolsonaristas que sempre se manifestam dentro da lei e da ordem. Onde está a Justiça, a isenção, a imparcialidade?
Ou só se pode manifestar para elogiar?
* Plinio A.V. Lis é jornalista