O NÚCLEO FAMILIAR CONTINUA INSUBSTITUÍVEL

Por Meraldo Zisman
03 fevereiro 2017

…Em 1988, o psicanalista Jurandir Freire Costa alertava que a sociedade brasileira poderia estar chegando a um perigoso ponto de não retorno. Ela estaria incorporando quatro valores: cinismo, narcisismo, violência e delinquência.

Com o advento da Internet constatou-se a recrudescência da infantilização do público. Deve haver algum motivo além dos suspeitos tradicionais: banalização da mídia, isolamento social, cultura de consumo e tantos outros argumentos tentadores à sua aclaração causal.

Em 1988, o psicanalista Jurandir Freire Costa alertava que a sociedade brasileira poderia estar chegando a um perigoso ponto de não retorno. Ela estaria incorporando quatro valores: cinismo, narcisismo, violência e delinquência. À época, seus estudos tinham como referência, entre outros, as ideias do filósofo alemão Peter Sloterdijk, cujas ideias culminariam no clássico livro “Crítica da razão cínica”, publicado na Alemanha em 1983 e traduzido para o português em 2012.

Nele, o autor aborda o crescimento do cinismo em escala institucional e pessoal, na atualidade. Para este autor, sob a capa das instituições e grupos, e em contrapartida com discursos de interesse público, crescem os componentes cínicos que se amparam em interesses privados. Estudioso do cinismo que se agigantava, o pensador alemão descria de efeitos positivos das potencialidades midiáticas tradicionais para a soberania popular ou a democracia.

Já o ponto de não retorno de Freire Costa atingiria diversas instituições e o comportamento individual. Segundo o psicanalista, a cultura do cinismo deriva da cultura narcísica e se não há como recorrer a regras supra individuais, historicamente estabelecidas pela negociação e pelo consenso para dirimir direitos e deveres privados, tudo passa a ser uma questão de força, de deliberação ou de decisão, em função de interesses particulares. Daí decorre o recurso sistemático à violência, à delinquência, à mentira, à escroqueria, ao banditismo ‘legalizado’ e à omissão de responsabilidade, que caracterizam a ‘Cultura cínico-narcísica’ dos dias de hoje” (Costa: 1989, p. 30-31).

Trabalhos recentes produzidos na Universidade de Stanford vêm demonstrando a importância da mídia social, através de dispositivos móveis ou fixos,  e da influência do poder de propaganda das várias parafernálias eletrônicas que hoje acompanham a formação dos jovens e afetam o comportamento de  pessoas de todas as idades.

Avoco a atenção do leitor para os trabalhos pioneiros do pediatra e psicanalista inglês Donald Woods Winnicot (1896-1971) afirmando que a criança aprende o mundo brincando e não distingue a realidade verdadeira da ilusória, imaginária, fantasiosa, idealizada. Ao brincar ela vai aprendendo a separar, a distinguir fatos e ideias – e  cada pessoa tem um potencial inato distinto, para amadurecer e integrar-se.

O adulto de hoje está perdendo a noção de como distinguir, por exemplo, o que é ético daquilo que fere a sociedade constituída…

Lembro ainda, de passagem, que essa tendência, apesar de ser inata, não ocorre necessariamente. Sua ocorrência dependerá de um ambiente facilitador que forneça apoio e direcionamento, assim como os de um lar, família, diálogo, carinho, aconchego. Ressalte-se ademais que a educação vai depender das necessidades de cada criança in-di-vi-du-al-men-te, já que cada pessoa responderá ao ambiente de forma própria, apresentando, a cada momento, condições, potencialidades e dificuldades diferentes para completar suas capacidades morais.

Na contemporaneidade, as informações são veiculadas, principalmente, pelo mundo virtual e absorvidas através de interpretações apressadas e superficiais. As pessoas, independentes da faixa etária, são levadas a uma dissimilação oculta da realidade, passando a viver em um mundo de ficção que as leva a uma infantilização globalizada.

Advirto: O adulto de hoje está perdendo a noção de como distinguir, por exemplo, o que é ético daquilo que fere a sociedade constituída. Boa parte do nosso aprendizado dá-se por imitação dos mais velhos. A aprendizagem começa na primeira infância e termina com a morte e repito, o núcleo familiar é insubstituível para o aprendizado e a compreensão da Moral.

_____________________

23/02/2011. Credito: Cecilia de Sa Pereira/DP/D.A Press. Recife/PE. Vida Urbana. Materia sobre a visita do presidente nacional da Associacao dos Diplomados da Escola Superior de Guerra, o brigadeiro Helio Goncalves a sede dos Diarios Associados PE. O brigadeiro esteve acompanhado pelos senhores Eudes Souza Leao e Meraldo Zisman (NA FOTO).

Meraldo Zisman – Médico, psicoterapeuta. Foi um dos primeiros neonatologistas brasileiros. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha)

Tirado do Chumbo Gordo
http://www.chumbogordo.com.br/11221-o-nucleo-familiar-continua-insubstituivel-por-meraldo-zisman/

 

Facebook Comments

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *