“Campos de concentração digitais”

 

Percival Puggina

 

Em nome do amor vencendo o ódio, estamos assistindo a mais odiosa caçada a adversários políticos desde 1978, já lá vai, portanto, quase meio século. É um longo tempo, cujos eventos se contiveram no espaço de vida intelectual ativa de pessoas com menos de 60 anos, atentas aos fatos nacionais. Em outras palavras, apenas os idosos (15% da população brasileira) tiveram experiências em tempos de liberdades restritas. Autoritarismo político em pleno funcionamento está sendo visto e vivido pela primeira vez por 85% dos brasileiros.

Não deveriam estar protestando contra isso? Sempre viveram e conviveram com governos e suas oposições. Sabem que o PT nunca deu moleza a seus adversários. Sempre puderam observar, também, que o PT, se perde uma eleição, seja presidencial, estadual ou municipal, desenrola a campanha padrão do “Fora fulano”, contra o sujeito sentado na cadeira que os petistas ambicionavam.

Sempre puderam assistir a maledicência e a destruição moral dos adversários, (muito bem retratados no livro “Assassinato de reputações”, best seller de Romeu Tuma Jr.).

Nunca, porém, essa geração mais jovem assistiu algo como essa sanha acusatória, essa caça às bruxas, essas ameaças públicas, essa criminalização da oposição, essa judicialização total da política, essas declarações de guerra, essas ações concretas de censura e restrição de direitos (inclusive de defesa), essa aplicação cruel de sanções severíssimas contra cidadãos acusados de pretender contra o Estado aquilo que o Estado, objetivamente, está a fazer. Nunca autoritarismo tão explicito foi usado contra um presidente enquanto o acusavam de pretensões ditatoriais…

Perceberam, leitores, que hoje não restam senão uns poucos bons comunicadores de perfil conservador e/ou liberal, em atividade no país? Os demais estão silenciados! Punidos! Investigados! No exílio! Contas bancárias bloqueadas! Demitidos de suas empresas! Tamanho foi o constrangimento que alguns desistiram e mudaram de ramo para viver em paz. As poucas empresas de mídia que não aplaudem de pé o jogo sinistro do topo do poder estão medindo palavras. Escolhendo assuntos.

Os que atuam de modo individual nas redes sociais confinam-se no que alguns, com muita propriedade, têm chamado “campos de concentração digitais”. Tal expressão define de modo adequado esses espaços patrulhados, sem privacidade, farejados por uma polícia digital de cães caçadores de palavras e temas proibidos que atuam para dar recheio aos infindáveis e inescrutáveis inquéritos abertos. Subsistem controlados em “primeira instância” pelas próprias plataformas que usam para expor seu pensamento. Também elas estão alinhadas com as causas e pautas do poder instalado e cuidam de controlar a propagação daquilo que produzem os comunicadores que ainda insistem em usar esses retalhos de liberdade tolerados pela patrulha dos campos de concentração digitais.

 

 

Percival Puggina (78),
membro da Academia Rio-Grandense de Letras,
é arquiteto, empresário e escritor e
titular do site Liberais e Conservadores  (www.puggina.org),
colunista de dezenas de jornais e sites no país.
Autor de Crônicas contra o totalitarismo;
Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões;
A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+

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